- Estimamos que o primeiro trimestre
será afetado, mas ainda existe o risco de que o segundo também seja e
até mesmo o ano todo. Por enquanto é difícil mensurar - diz Silvio
Campos Neto, economista sênior da Tendências.
Até aqui, os
grandes bancos mantêm suas previsões para o PIB deste ano, sendo
Santander com 2%, Bradesco com 2,5% e Itaú com 2,2%.
Mas já surgem
revisões. Na última semana, o Banco ABC divulgou projeção de alta de 2%,
recuando de 2,5%, sendo um corte de 0,3 ponto percentual devido aos
efeitos do coronavírus.
- É uma sequência de más notícias. Não é
um problema de demanda brasileira, mas de risco de não ter a oferta de
matéria-prima. Temos que torcer para que esse ambiente não aborte a
recuperação de consumo, que vinha acontecendo - afirma Luis Otávio Leal,
economista-chefe do ABC.
O secretário de Política Econômica do
Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, reconhece que o avanço do novo
coronavírus pode afetar o crescimento do país neste ano. Mas manteve a
projeção alta de 2,4% do PIB. A crise global, segundo ele, pode afetar o
mercado nacional por meio de três canais: demanda global, menor oferta
de insumos e preços de commodities.
Só em 2019, o mercado
brasileiro comprou cerca de US$ 35 bilhões em produtos chineses - 98%
desse valor em importação de manufaturados.
Tanto Leal quanto José
Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, comparam
possíveis efeitos do coronavírus com a greve dos caminhoneiros de 2018,
pela trava na chegada de matéria-prima e insumos.
- É um
pequeno choque na oferta. A diferença é que na greve tinha uma
participação de decisão do governo. Da China, não, o que eleva o grau de
incerteza - conta Gonçalves, que revisou previsões de crescimento do
PIB de 2,2% para 1,4% em 2020, sendo 0,2% de impacto do coronavírus. - A
gripe é mais um limitador à lenta retomada brasileira.
Para
Leal, há o impacto ainda não mensurável na confiança dos agentes
econômicos. O índice de confiança do consumidor da Fundação Getulio
Vargas (FGV) recuou para 87,8 pontos, o menor patamar desde maio de
2019:
- Vínhamos de um momento de otimismo, agora as notícias
são negativas, com a alta do dólar e coronavírus. É o maior risco, algo
momentâneo ser mais duradouro por causa da perda de confiança.
Na
indústria eletroeletrônica, as empresas já vivem problemas na
importação de materiais, componentes e insumos. Pesquisa da Associação
Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), divulgada na
véspera de carnaval com 50 companhias, mostrou que 57% das entrevistadas
já relatam essa dificuldade, sobretudo os fabricantes de computadores e
celulares. Há 15 dias, eram 52% dos ouvidos.
Hoje, 42% dos
itens usados na produção do setor vêm da China, tendo somado US$ 7,5
bilhões em 2019. O presidente executivo da entidade, Humberto Barbato,
diz que a pesquisa indica agravamento da situação:
O momento é
delicado, e devemos ter diversas paralisações (de empresas) daqui para a
frente. O problema só não é mais grave porque dispomos da produção
local.
Das empresas entrevistadas, 4% já operam com paralisação
parcial. Outras 15% programaram fazer o mesmo nos próximos dias. Com
isso, 17% das pesquisadas estimam que não devem atingir a produção
prevista para este trimestre, que ficará, em média, 22% abaixo do
projetado.
Alexandre Ostrowiecki, presidente da Multilaser,
fabricante de celulares a aspiradores, diz que os efeitos da epidemia
devem chegar logo:
- Vamos ter falta de produtos, mas quão
severa vai ser essa falta ainda depende do ritmo das fábricas, que estão
voltando ao trabalho.
A Multilaser produz dois milhões de
produtos por mês nas fábricas de Extrema (MG) e Manaus (AM), cada uma
com cerca de 200 componentes vindos da China.
Impactos diferentes
Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação Nacional do
Comércio (CNC), avalia que o impacto será sentido de formas diferentes,
dependendo do setor.
- Os setores dependentes de importação da
China já sofrem. O que se agrava com a alta do dólar. O alívio poderia
vir do estoque, mas que neste momento é reduzido, por causa da crise.
Outra saída é substituir importações, algo que requer algum tempo e que,
em alguns casos, não é viável.
Para o comércio, o efeito pode ser até positivo:
- Com a queda da taxa de juros e a inflação lá embaixo, o comércio
tende a ganhar. A queda de preço de commodities como soja e milho,
melhora o preço desses itens no país. O petróleo mais barato colabora
para a redução do custo de frete.