No período de dez anos, o Grande ABC registrou aumento no número de trabalhadores com carteira assinada que recebem até três salários mínimos (R$ 3.135). Entre 2008 e 2018, o grupo aumentou de 429,8 mil pessoas para para 501,7 mil, ou seja, acréscimo de 71,9 mil colaboradores. Se em 2008 este bloco representava 59% do total do mercado formal, em 2018 a proporção atingiu a marca de 69%.
O levantamento foi feito com
base nos números da Rais (Relação Anual de Informações Sociais) do
Ministério da Economia pelo coordenador de estudos do observatório
econômico da Universidade Metodista de São Paulo, professor Sandro
Maskio, a pedido do Diário. Nos números consolidados da Rais, 2018 é o
ano mais recente disponível.
O saldo mostra que, no
período desta década, o mercado formal da região ganhou 4.217 postos de
trabalho com carteira assinada. Somente o saldo - admissões menos demissões
- relativo à faixa de remuneração até três salários mínimos ficou
positiva em 71,8 mil pessoas. Acima desse índice de remuneração, todas
as faixas ficaram no negativo (veja mais na arte abaixo).
Ou seja, os dados mostram
que o emprego com menor faixa salarial foi o único indicador que cresceu
no período. De acordo com Maskio, ainda efeito da retração econômica
que teve início em meados de 2014 em todo o País, sem recuperação
consolidada.
"Ainda há um efeito forte
da retração do mercado de trabalho. A redução no número de pessoas
empregadas, por causa da crise, vai gerar um movimento onde há muitos
desempregados. Ou seja, a oferta é muito grande, isso amplia a
rotatividade no mercado de trabalho, porque no momento de substituir, o
empregador vai trocar a mão de obra com valor maior por aquela de
salário menor e há muitos mais pessoas disponíveis para essa vaga",
analisou o docente.
Economista e coordenador do
curso de administração do Instituto Mauá de Tecnologia, Ricardo
Balistiero também cita que a crise eliminou funções de trabalho, que,
inclusive, estavam no topo do organograma das empresas. "O corte
aconteceu desde postos de trabalho na produção, mas foi até cargos de
chefia. Há muitos executivos que perderam o emprego nesse período e
estão procurando colocação até hoje ou aceitaram um emprego que paga
menos", disse.
Para Maskio, isso ilustra
uma situação alarmante no mercado de trabalho regional: há diminuição no
emprego mais qualificado, que, na teoria, é o que tem maiores salários,
o que pode gerar consequência até na entrada de jovens nas
universidades.
"É muito preocupante,
porque esses trabalhadores que ganham menos são pessoas que tiveram que
reajustar o padrão de vida. Com isso, há diminuição na capacidade de
consumo das famílias, porque o salário é achatado (leia mais ao lado).
Isso impacta em diversos setores da economia como comércio e serviços.
Além disso, também pode gerar um efeito muito ruim de desestímulo à
qualificação das pessoas, o que traz consequências a longo prazo. Temos
uma situação onde pessoas qualificadas ficam longe do mercado, acontece a
depreciação desses profissionais e gerações mais novas têm pouco
estímulo para estudar. Isso porque a sociedade observa que a
qualificação e educação não dão essa resposta de um bom emprego",
analisou Maskio.
Parte deste cenário também
foi retratada em reportagem do Diário na última semana, em que foi
mostrado que a região possui mais empregos, porém a remuneração caiu.
Além disso, em 2019, o salário médio dos demitidos (R$ 2.077,02) na
região superou a remuneração média dos contratados (R$ 1.724,92).
Para
Maskio, a situação deve demorar mais de uma década para mudar, caso o
crescimento continue nesse ritmo. "A economia precisa crescer e
precisamos voltar a gerar emprego, que é sempre o último indicador a se
recuperar."